Uma biblioteca “é uma voz contra a ignorância; uma luz perene contra a obscuridade”.

Por: Angela Cristina Pelicioli, professora e doutora em Direito pela PUC/RS.

A determinação do gestor estadual de educação de Santa Catarina para a retirada de circulação na rede pública de 09 livros, indicados no ofício circular de 07/11/2023, pode configurar violação de vários dispositivos constitucionais, inclusive o princípio da impessoalidade na escolha. Como se sabe, cabe à administração pública o dever de divulgar a motivação do ato que levou a escolha e o porquê do recolhimento desses livros específicos e da sua não acessibilidade à comunidade escolar catarinense (art.20, caput e parágrafo único da LlNDB) . Além disso, essa escolha pode infringir os princípios da legalidade, da publicidade e da eficiência, previstos no art. 37, caput, da Constituição Federal.

Não é a primeira vez que governos tentam retirar, censurar e/ou apreender livros no ensino público: é de triste lembrança histórica que alguns governos transformaram livros em fogueiras. No entanto, o amparo jurisdicional do Supremo Tribunal Federal é favorável ao fortalecimento da democracia, quando determina que: 1.” o regime democrático pressupõe um ambiente de livre trânsito de ideias, no qual todos tenham direito a voz. De fato, a democracia somente se firma e progride em um ambiente em que diferentes convicções e visões de mundo possam ser expostas, defendidas e confrontadas umas com as outras, em um debate rico, plural e resolutivo.” (Suspensão de Liminar-RJ n° 1.248, relator Ministro Dias Toffoli ; 2. ao Estado não cabe demonstrar qualquer predileção que cause discriminação (ADI- MT 5.256, rel. Min Rosa Weber); e, 3. a Constituição Federal proíbe qualquer censura (art. 5°, inciso IX e art. 220, parágrafo 2°), e o “não cerceamento do direito à liberdade de expressão” (ADI-DF n° 4.815, relatora Ministra Carmen Lucia).

Espera-se que o Governo do Estado de Santa Catarina, após publicizar os documentos que demonstrem os motivos da escolha e as consequências futuras (art. 20, da LINDB) do ato de retirada dos livros, consiga investir mais recursos públicos na compra de livros para a melhoria do ensino na rede pública, estruturando as escolas e suas bibliotecas! É fato que, por exemplo, a biblioteca pública de Santa Catarina – que neste ano completa 169 anos – está em condições precárias de estrutura, visto que a internet falha e os computadores da “era da internet discada” não conseguem atender às necessidades básicas da população, que precisam de mais livros. Como ensina Federico Garcia Lorca, uma biblioteca “é uma voz contra a ignorância; uma luz perene contra a obscuridade”*.

*LORCA, Federico Garcia. Dime que lees y te diré quién eres. Medellín: Confiar, 2007.